
Historia del arte, investigación y museo
Entrevista de caiana a Tadeu Chiarelli
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“Historia del arte, investigación y museo. Entrevista a Tadeu Chiarelli”. En caiana. Revista de Historia del Arte y Cultura Visual
del Centro Argentino de Investigadores de Arte (CAIA). No 8 | Primer semestre 2016, pp. 160-164.
Tadeu Chiarelli es Professor Titular de la Universidad de San Pablo y Director General de la Pinacoteca del Estado de San Pablo. Fue curador en jefe del Museo de Arte Moderno de São Paulo (1996-2000) y Director del Museo de Arte Contemporáneo de la USP (2010-2014). Es autor de libros sobre historia de la crítica del arte, y sobre arte moderno y contemporáneo en Brasil. Como curador fue responsable de una serie de exposiciones sobre el arte en Brasil.
Dada tu práctica profesional en los campos de la curaduría, investigación y docencia académica, nos interesaría saber cuál es tu reflexión acerca del cruce e interacción de esos campos, particularmente en Brasil. ¿Se producen mayormente encuentros o desencuentros? ¿En qué sentido esos cruces inciden en la producción teórica y crítica de la investigación académica?
De início gostaria de afirmar que só posso responder a esta e às outras perguntas do meu ponto de vista, ou seja, aquele de um profesor universitário, em atividade e que também dirige uma instituição museológica vivendo em uma cidade determinada. Digo isto logo de início porque não pretendo emitir nenhuma opinião que pretenda dar uma dimensão do Brasil como um todo. O Brasil, como sabemos, é um país imenso, com cidades com realidades culturais e artísticas muito distintas entre si. Falo de São Paulo, da Universidade de São Paulo e da Pinacoteca do Estado e esta localização é o que define o meu ponto de vista. Some-se a este lugar específico em que me encontro, uma experiência profissional singular: desde 1983 sou profesor junto ao Departamento de Artes Plásticas da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA USP) e, junto à docência na área de História da Arte no Brasil, séculos XIX, XX e XXI, desenvolvi uma série de atividades paralelas junto à Divisão de Pesquisa do Centro Cultural São Paulo, à Fundação Bienal de São Paulo, além de ter exercido a crítica de arte junto a alguns jornais e revistas de grande circulação no país (tudo isso, diga-se, ainda nos anos 1980).
Lecionar História da Arte na USP e, ao mesmo tempo, lidar com a produção artística contemporânea (na Divisão de Pesquisas do CCSP, na Bienal e em jornais e revistas), desde o início me possibilitou refletir sobre a arte contemporânea a partir de um viés “histórico”, digamos assim, e o pasado da arte brasileira a partir de uma perspectiva contemporânea. Junte-se a essa prática, uma formação acadêmica – engendrada na USP sobretudo nas aulas de Walter Zanini e Annateresa Fabris – , que, sob as bases teóricas de Giulio Carlo Argan, acreditava no seguinte: estudo História da Arte porque me interessa a arte contemporânea; estudo arte contemporânea por que interessa a História da Arte. Perceber a produção contemporânea dentro de um lastro histórico e perceber a arte do pasado e sua possibilidade de ressignificação no presente.
Foi a partir desse início de carreira atrelado à pesquisa, à docência e à prática da crítica de arte que desenvolvi meu primeiro projeto curatorial, “Imagens de Segunda Geração”, uma exposição preparada para o Museu de Arte Contemporânea da USP (MAC USP), em 1987. Nessa mostra apresentei um recorte da pesquisa que então realizava junto à Divisão de Pesquisas do CCSP, uma série de obras de jovens artistas de São Paulo que operavam com imagens “readymade”. A qual público se destinava essa exposição? Idealmente aquele composto por meus estudantes da USP que acompanhavam o desenvolvimento conceitual da mostra em sala de aula.
Dessa primeira experiência como curador/docente, posso afirmar que todos os meus principais trabalhos em curadoria estiveram ligados à pesquisa e à docência. Meus projetos de exposições tendem sempre a brotar do embate entre questões que me coloco como pesquisador e que discuto com meus estudantes em sala de aula. E não apenas isso: vejo o resultado das exposições como um elemento a mais da pesquisa que tende a continuar e se tornar mais complexa a partir do embate entre as obras e minhas ideias originais no espaço de exposição.Mas repito que mina experiencia tem lá sua singularidade no contexto de São Paulo e só pode encontrar ponto de contato com raros colegas docentes que também desenvolvem projetos de curadoria.
De uma maneira geral, no entanto, percebo que a cena curatorial de São Paulo é presa de pressões as mais diversas, sobretudo aquelas ligadas ao mercado de arte. São poucos os colegas que entendem uma curadoria como apenas um elemento dentro do proceso geral da pesquisa. Daí, talvez, o fato de muitas mostras não deixarem rastros após seu término.
Y dentro de esta misma problemática pero en relación con el patrimonio artístico ¿cómo entendés que se plasma en exposiciones la investigación sobre el patrimonio y los nuevos relatos de la historia del arte?
Eu não diria “novos” relatos e, sim, “outros” relatos. E “outros” no sentido de que eles ampliam – muitas vezes até esgarçando ou rasgando – o relato até então hegemônico. Enquanto Curador-chefe do Museu de Arte Moderna de São Paulo (trabalho desenvolvido entre 1996 e 2000) e, depois, como Diretor do MAC USP (entre 2010 e 2014) desenvolvi algumas experiências interessantes com os respectivos acervos dessas instituições, usando-os para desmistificar certas “verdades” da História da Arte Moderna do Brasil, propondo outras possibilidades para rever aqueles dois acervos.
Lembro-me de um exemplo bem claro: a exposição “Modernismos no Brasil”, que ficou em cartaz no MAC USP entre outubro de 2011 e janeiro de 2012. A idéia era conceber/produzir uma exposição que mais do que homenagear, refletisse sobre os 90 anos da mítica Semana de Arte Moderna de 1922, que seria comemorada em fevereiro de 2012. Uma reflexão por meio de uma exposição que não repetisse esquemas tradicionais de se pensar o Modernismo no Brasil.
A primeira estratégia foi o próprio título da mostra: ao invés de propor algo como “Modernismo brasileiro” ou mesmo “Modernismo no Brasil”, optei pelo plural – já de início uma negação do conceito estabelecido de que o fenômeno da modernidade da arte no Brasil foi um fenómeno isolado, referindo-se apenas a alguns protagonistas “genuinamente” locais. Pelo contrario. Aproveitando-me do excepcional acervo brasileiro e internacional do MAC USP, a idéia foi, de imediato, não separar as obras, quer pela nacionalidade dos autores, quer pela cronologia mais convencional. A idéia foi mostrar obras de artistas brasileiros ao lado de obras de artistas internacionais, chamando a atenção do público, não para grupos e movimentos (muitas vezes criados artificialmente), mas para questões formais relevantes que não respeitavam (e ainda não respeitam) o tempo cronológico e, muito menos, barreiras geopolíticas. Por sua vez, a oportunidade de colocar lado a lado artistas distantes no tempo e no espaço, fez emergir questões de cunho político e ideológico que durante muito tempo permaneceram submersas no relato oficial da arte brasileira. Além do trabalho com aquele acervo excepcional, a exposição foi também o lugar de chegada, digamos assim, de anos de estudos que venho desenvolvendo sobre a arte da primeira metade do século XX no Brasil, lugar de chegada e plataforma de lançamento para novos desafios para a mina pesquisa e a de meus estudantes. Assim, “Modernismos no Brasil” apresentou um “outro” relato para aquele período da arte no país, contrariando muitos aspectos da narrativa hegemônica.
Outra experiência importante para mim neste sentido ocorreu alguns anos antes, em 2003 quando, com minha colega Diana Wechsler, concebemos a mostra “Novecento Sudamericano”, apresentada em Milão e São Paulo. Naquela mostra, e sem nenhum alarde, trouxemos uma outra possibilidade para se refletir sobre a arte na América Latina, fora dos chavões de “latinidad” mais em voga até hoje (diga-se). Chamamos a atenção para como o fato da cultura visual italiana ter sido fundamental para a constituição de uma produção artística em países como Brasil, Argentina e Uruguai, e como essa cultura visual se transformou ao chegar nesses países. É claro que por trás desse fenômeno estava todo o processo de imigração italiana nesses países – questão que não respeitou fronteiras e que ainda está para ser devidamente aprofundada.
E como foi possível conceber essa exposição? Porque Diana e eu vínhamos há muito tempo pesquisando e refletindo sobre a presença da arte italiana do início do século pasado em nossos países que, aliás, não foi apenas motivo para aquela exposição, mas também para nossas aulas e cursos regulares nas universidades em que trabalhamos.
Y fuera de esas exposiciones temporales que mencionás, en cuánto a los criterios de exhibición de una muestra permanente y como éstos se generan, por ejemplo sobre la pintura brasilera ¿se concibe como un relato constante, cambiante, totalitario, fragmentario? ¿Qué pasa y cómo intervienen en esos relatos las llamadas «obras maestras», esas obras que el público quiere ver y que se supone que deben ser exhibidas siempre? ¿Y qué pasa, por el contrario, con el resto del patrimonio, que se encuentra fuera de las salas, en los depósitos?
Quando assumi o cargo de Curador-chefe do MAM SP, em 1996, o museu ainda vivia sob o trauma de ter perdido o seu acervo original, ainda no início dos anos 1960 (acervo este que daria origem ao MAC USP). As coleções que foram formando o novo acervo do MAM SP de 1968 em diante, sempre eram vistas como irremediavelmente inferiores às obras perdidas, o que levava o Museu a pouco apresentar o acervo que foi constituindo com o passar dos anos e a investir pouco em seu crescimento. Para se ter uma idéia da situação, não existia uma sala específica para mostrar o acervo com exclusividade. Ali desenvolvi uma política que tinha como objetivo primeiro dar visibilidade ao acervo já existente, apresentando-o em exposições que dialogavam com as mostras temporárias que ocorriam na Grande Sala do Museu (um paradoxo: as exposições temporárias é que, em tese, deveriam dialogar com o acervo, mas naquele contexto ocorria o contrario).
Nessas mostras do acervo apresentávamos conjuntos de obras que se relacionavam por meio de conexões formais ou “temáticas”, sem amarrá-las à cronologia tradicional da arte e sem optar apenas pela exibição das “obras primas”. Pelo contrario, a ideia era establecer relações produtivas entre essas obras “maestras” e aquelas até então nem um pouco cotadas pelo próprio Museu. Tal estratégia aos poucos foi revelando para o público em geral, e para a própria instituição, a riqueza do acervo existente que, por sua vez, sinalizava para quais novas aquisições deveriamos fazer para torná-lo ainda mais interesante para o público.
Ainda no sentido de fomentar o interesse pelo acervo do MAM SP, instituí naquela época o Grupo de Estudos em Curadoria do Museu, formado, em sua maioria, por jovens profissionais – entre os quais três deles que, na época, eran meus orientandos no Programa de Pós-Graduação da ECA USP –. Nós nos reuníamos quinzenalmente para discutirmos o Museu e suas coleções e, cada um dos membros do Grupo, comprometia-se a desenvolver pelo menos uma curadoria por semestre, apenas com obras do acervo do MAM SP. A partir das discussões e de estudos junto ao acervo da Instituição, foram concebidas ótimas mostras que não apenas ajudaram a dar maior visibilidade às coleções que então formavam o acervo do MAM SP, como também ajudaram a explorar – na prática – outras possibilidade de criar narrativas (ou micronarrativas) sobre a arte no Brasil. Alguns dos integrantes daquele Grupo hoje desempenham papeis importantes no ámbito da curadoria de arte no Brasil. Esse mergulho que, junto com os outros membros do Grupo, foi realizado no acervo então existente do MAM, permitiu que conseguíssemos estabelecer parâmetros concretos para a ampliação do mesmo, e hoje o acervo do MAM SP é uma das referências de arte contemporânea brasileira no país.
Meu interesse por uma História da Arte que revisasse os clichés mais instituídos da arte no Brasil ganhou força em minhas atividades como Diretor do MAC USP, anos depois. Lembro-me que na primeira grande exposição que inaugurava oficialmente a nova sede do Museu, no Parque Ibirapuera, em 2013 – “O Agora, o Antes: uma síntese do acervo do MAC USP” –, não tive a menor dúvida em apresentar algumas das “obras primas” do acervo do Museu ao lado de obras de jovens artistas locais (como exemplo poderia citar o “Autorretrato” de Amedeo Modigliani – o único autorretrato conhecido daquele artista -, ao lado de autorretratos de jovens como Júnior Suci e Albano Afonso, então recém-adquiridos pelo Museu). O intuito da mostra era evidenciar a necessidade de rever o conceito de que a arte contemporânea rompia em definitivo com a arte moderna. Interessava mostrar ali que, em muitos casos, o artista contemporáneo parte da experiência do passado para ampliá-la em todos os seus limites até, por fim, romper com ela ou reatualizá-la. E para explicitar tal argumento, nada mais estimulante do que colocar lado a lado obras do início do século XX e obras da segunda década do século XXI.
En ese mismo sentido ¿cómo ves el diálogo de diferentes colecciones de museos? ¿o la interacción entre los relatos y las competencias o colaboraciones entre instituciones?
Creio que nas considerações acima explicitei as possibilidades de diálogo entre diferentes coleções dentro de um determinado acervo. Mas é claro que um trabalho de diálogo mais intenso entre coleções depende de cada instituição e do grau de maleabilidade e de propensão em ousar, presente em cada museu.
Suponho que o que identifica um museu de arte contemporânea não é apenas o seu acervo mas, sobretudo, a forma como a instituição opera com suas coleções, criando novas possibilidades para exibi-las. Outro dado importante também é o próprio assunto eleito para direcionar um trabalho curatorial. Em 2015, por exemplo, tive a oportunidade, já na Pinacoteca do Estado, de realizar uma exposição que tinha como propósito mostrar ao público uma seleção de obras já pertencentes ao acervo do Museu, realizadas por artistas negros brasileiros (obras do séc. XVIII, XIX e XX). A idéia, de fato, era apresentar uma série de obras recém-adquiridas pelo Museu, e produzidas por jovens artistas negros locais, ao lado dessas obras mais antigas. Faz anos que me interesso pela inserção do artista afrodescendente no sistema artístico brasileiro – sistema este de reiteradas ações de cunho racista, aliás, muito própria da elite branca local. No entanto, até então tinha um contato apenas teórico com a produção negra dos séculos passados, tendo mais intimidade com a produção contemporânea de artistas afrodescendentes, sobretudo aqueles atuantes em São Paulo.
Propor essa mostra – que se chamou “Territórios: artistas afrodescendentes no acervo da Pinacoteca” – revelou-se um empreendimento quase impossível, se eu quisesse estabelecer um relato que artificialmente naturalizasse a presença do artista negro na arte brasileira (e, conseqüentemente, no acervo da Instituição). Como a própria história da sociedade brasileira afrodescendente, a presença do artista negro no sistema artístico local é fragmentária, aparentemente rarefeita, em última instância, “invisível”. Impossível forjar uma narrativa aparentemente plena porque, a meu ver, soaria simplesmente falsa. Ao invés de um eixo condutor, de uma espécie de estrada que ligasse todas as gerações de artistas negros presentes no acervo da Pinacoteca, o que existia eram bolsões, territórios isolados entre si, ou com parcas conexões.
Tal realidade me levou a conceber uma exposição em que esses “territórios” ocupavam espaços contíguos mas, de varias maneiras estanques entre si, como se cada geração de artistas negros no país começasse seu trabalho sempre do zero (é claro que tal visão estava desde sempre muito contaminada pela ainda frágil presença de artistas negros no acervo da Instituição). Assim, a mostra acabou ganhando uma dimensão um tanto estanque em seus segmentos, como se ela, a cada sala, desse início a uma mostra diferente.
Neste sentido, foi possível concluir que a coleção de obras de artistas negros do século XIX não dialoga com a coleção de obras de artistas negros do século XX e nem com as obras dos artistas negros atuais. Percebi, portanto, com essa mostra, que não é possível criar narrativas unindo coleções, quando elas fazem emergir questões ligadas à sociedade fracionada pelo preconceito, como aquela que as gerou.
No entanto, em outros casos, é perfeitamente possível desenvolver diálogos extremamente proveitosos, inclusive com coleções de outras instituições museológicas. A Pinacoteca, por exemplo, possui um programa de mostras denominado “Diálogos”, em que apresenta, ao lado de suas salas que exibem o acervo em exposição permanente, mostras de acervos congêneres, de São Paulo, de outras cidades brasileiras e mesmo do exterior. Essas mostras produzem novas possibilidades para se refletir sobre as obras que compõem nossas coleções, sobretudo aquelas do século XIX.
Entonces ¿Cómo ves el rol social de los museos hoy? ¿Qué programas de educación creés que son relevantes?
Creio que além de continuar investindo em seus objetivos mais tradicionais (colecionar, preservar, estudar e exibir seus acervos), os museus hoje em dia, talvez mais do que nunca, devem criar condições para se tornarem verdadeiros espaços para a formação de cidadãos críticos frente à realidade tendo, porém, sempre o cuidado de manterem seus acervos como o mote para todos os processos de aprendizagem e socialização que ocorrem em seus espaços.
¿Te parece que los museos u otros espacios de exhibición latinoamericanos tienen hoy un posicionamiento particular como instituciones?
Suponho que, de maneira geral, os principais museus latinoamericanos se encontram hoje em uma grande encruzilhada: por um lado têm a possibilidade de constituirem-se como espaços de discussão e formação de cidadãos mais conscientes, a partir do trabalho criativo com seus acervos; por outro, existe sempre a ameaça de serem tragados pelo circuito artístico hegemônico, tornando-se meros replicantes de propostas alheias aos seus objetivos primordiais. Explicando melhor: ou eles aprofundam o conhecimento sobre e a partir de si mesmos, dividindo-o com a comunidade, ou passam a funcionar de vez como meros balcões de exposições a serviço do mercado de arte local e internacional.